Para tirar já todas as dúvidas começamos já por dizer que: "- Nós não somos mães waldorf!"
Como não gostamos de de enganar ninguém, queremos deixar isto já esclarecido.
Depois de ler atentamente inúmeras listas, posts e artigos, a certa altura estávamos à espera daqueles testes que preenchíamos nas revistas femininas no Verão, na praia, durante a adolescência, mas infelizmente não encontrámos nenhum ( se alguém souber de um por favor envie ), resolvemos escrever este post.
Toda esta leitura serviu para confirmar o que já intimamente sabíamos, para alívio nosso, não somos mães Waldorf, não temos uma família Waldorf, nem tão pouco uma casa Waldorf! E ficámos muito felizes por isso!
Passamos a explicar... na nossa opinião, que vale o que vale, não existem nem pais Waldorf, ou Montessorianos, ou Pikler, ou Freinetianos , ou Positivos, ou Conscientes ( estes últimos não literalmente, mas como definição exterior)...Existem Pais, ponto final!
Existem pais que tentam seguir os príncipios de determinadas pedagogias, conceitos ou abordagens; existem pais que têm filhos que frequentam determinadas escolas ou instituições que seguem, ou dizem seguir, determinadas pedagogias; existem pais que seguem determinadas visões do ser humano e do seu desenvolvimento; existem pais antropósofos, católicos, budistas, ateus, mas a nossa questão é, porque temos esta necessidade de rótulos e delimitações no que toca à parentalidade? E a que custo as utilizamos?
Como sabem, gostamos imenso de olhar para a história. E como tal, este fenómeno da auto-denominação de pai qualquer coisa, é recente, muito recente mesmo, tão recente quanto as redes sociais, e um tanto preocupante a nosso ver.
Vamos pedir-vos que façam uma pequena viagem no tempo até aos anos 70, aqueles que já eram vivos poderão conseguir vivenciar esta década mais facilmente, como nós. Os anos 70 foram a época da liberdade de pensamento e ideias, no nosso país em particular, visto estarmos a sair de uma longa ditadura.
Esta foi a época do aparecimento em Portugal, de uma variedade de estabelecimentos de ensino que se distinguiam pelas suas abordagens educativas diferenciadas. Rapidamente os pais da altura, consoante as suas convicções e "carteiras" puderam escolher as escolas que queriam para os seus filhos e podemos dizer que sim, nessa época as pessoas estavam com uma sede de fazer a diferença, de acreditar que estávamos a criar um mundo novo e que os seus filhos nunca mais teriam de viver reprimidos e assustados por serem quem eram, devido a um poder opressor. Surgiram inclusive inúmeras iniciativas de pais, diversas cooperativas de ensino para proporcionar a todos a opção pedagógica com que sonhavam, muitas delas permanecem até aos nossos dias, em paralelo com as centenas de instituições escolares religiosas que foram se mantendo ao longo deste processo.
Os nossos pais (daqueles que já aqui andavam na altura), nunca disseram a título de conversa enquanto esperavam pela consulta no posto de saúde: "- Olá sou fulano de tal, eu sou um pai Pestalozzi, ou Freinet, ou outra coisa qualquer..., ", poderiam talvez sim, indicar que eram comerciantes, advogados, ou cabeleireiros, ou outra coisa qualquer, do que temos séries dúvidas, pois não tínhamos por costume expor a nossa vida, num primeiro contacto, mas acima de tudo porque a sua parentalidade, tal como a sua identidade, não implicava um título!
Já para não falar, de quantos teriam sido perseguidos ( alguns ainda o são) por esta mesma atribuição de títulos?!
No entanto hoje, a grande maioria de nós, não se inibe do o fazer nas suas biografias digitais das redes sociais ou mesmo em encontros sociais. E a razão, não é por hoje vivermos em liberdade, como muitos querem fazer acreditar, ou por não termos nada a esconder. Já vivemos em liberdade há pelo menos 40 anos (no sentido de não existir uma censura oficial), e como dissemos este é um fenómenos muito recente.
O que nos levou a questionar, porque temos hoje uma necessidade imensa de mostrar aos outros quais as nossas habilitações e convicções, como o facto de existirmos não ser suficiente para provar que somos merecedores de reconhecimento e valorização? Ou seja, a censura hoje em dia é interna, todos nós estamos convencidos de que se não (a)parecemos, não somos! Por isso é melhor deixar tudo explicadinho logo à partida, para não haver dúvidas!
Depois de anos a lutarmos para podermos ser nós próprios, passados 40 anos, temos gerações de adultos que, não só necessitam do título académico, religioso e desportivo e afins como até de parentalidade específica! Porque estamos a deixar que os nossos títulos nos definam em vez da nossa natureza?
Porque é que, num mundo livre de escolha e pensamento, como o em que supostamente vivemos, voltámos a sentir a necessidade de pertencer a um grupo, tribo, clube, em todos os aspectos da nossa vida?
Porque esta identificação que acaba, ao mesmo tempo, por ser uma diferenciação e, como tal, uma separação?
Pedimos a cada um de vós que tome o primeiro passo, e se são pais que se definem como pai segundo qualquer coisa, pensem seriamente porque considero eu que o sou?
O que me levou a ser este coleccionador de títulos, até mesmo na definição da minha família?
Qual a necessidade de interna que me levou a ter um currículo de identidade?
A grande questão, a nosso ver é que ao optarmos por escolher determinados rótulos, estamos quase como que a entregar um cartão de visita a todos os que se aproximem de nós, à espera de atrair apenas aqueles que, supostamente, serão semelhantes a nós. Não queremos perder tempo a ter de descobrir o outro e deixar que nos descubram, não temos temos para confrontos na nossa vida! Ao procurarmos a identificação estamos automaticamente a criar uma separação, e a perder a oportunidade de aprender com a diferença e a variedade.
Nunca se falou tanto de espiritualidade e meditação, como nos dias correntes, ambos os temas terão como propósito encontramo-nos a nós mesmos, reflectirmos sobre o nosso propósito nesta vida e estarmos em conexão com o todo. Mas, por outro lado, nunca a sociedade, no geral, se preocupou tanto com rótulos sociais como forma de identidade, ou seja o que temos ou o que consumimos define quem somos, e ao unir-nos em grupos separamo-nos automaticamente do resto (do todo), como se todos os que não tenham os mesmos interesses, automaticamente não são merecedores da nossa atenção. Criamos elites titulares!
Como referimos acima, ao lermos todas as nossas fontes para este post, a certa altura estávamos mesmo a torcer para um questionário estilo de revista feminina ou facebook (para ser mais actual), pois este seria na realidade o mais genuíno e representativo do que estamos a viver e, talvez aí alguns de nós levassem finalmente a mão à cabeça, e pensasse: "- Mas que raio ando eu aqui a fazer? Estou a participar nisto para me divertir, ou acredito mesmo que preciso desta validação de quem sou?"
Como dissemos a maioria dos questionários que falamos, e que todos o conhecem, não podemos negá-lo, eram feitos quando? Na adolescência.
A Adolescência, ou seja, aquele período da vida em que estamos a descobrir quem somos, em que os grupos de pares ditam parte da nossa imagem e modelam a nossa forma de estar, em que procuramos descobrir o Eu para além da família e o nosso lugar na sociedade, mas temos demasiado medo ainda para o fazermos sozinhos. Ou seja, em que estamos a aprender a ser, a acordar para o nosso Eu e propósito de vida, a tentar tirar sentido do mundo ao nosso redor. Esta fase, sim é a fase dos rótulos, do sou Punk, Hippie, Emo, Gótico, etc... e tal, não nos peçam referências mais actuais que, neste momento, já nos são difíceis de acompanhar.
Sim, a fase da rebeldia contra o sistema e a cultura, em que tudo é preto ou branco, em que não há espaço para os cinzentos da vida, pois temos pressa, e na verdade ainda pouca consistência nas nossas convicções e por isso medo de vacilar, ou de sermos apanhados "fora de pé", e que alguém de fora perceba as nossas fragilidades.
O que nos colocou a questão: será este então o patamar da evolução da Sociedade Actual, nos países desenvolvidos? Estamos nós hoje a viver a adolescência da Sociedade? Que quer isto dizer, então? Estamos nós então, em modo regressivo, ou nem por isso? E quais as implicações?
Temos adultos que estão literalmente a perlongar a sua adolescência indefinidamente, até na sua parentalidade. ( Será este o fenómeno Peter Pan, da parentalidade? Com a nossa vontade tão forte de irmos contra a corrente, provarmos que somos diferentes e jovens acabámos por cair na armadilha de ter de procurar um gang, porque não sabemos enfrentar o mundo sozinhos? Quando todos intimamente sabemos, que este caminho terá sempre de ser feito sozinho, porque independentemente de toda a companhia que tenhamos, nunca seremos nós mesmos, se continuarmos a copiar as escolhas e identidades dos outros.
Esta parece ser a realidade, principalmente na parentalidade, não perdemos tempo a buscar quem somos como pais. Encontramos hoje pais que não se conseguem escutar, que têm medo de seguir o seu instinto e de perder tempo a descobrir qual os valores e convicções. Que seguem os rankings ou as pedagogias alternativas porque esta é a imagem social com a qual pensam que se querem identificar. Ou seja, a grande maioria de nós acaba por seguir a corrente, seja ela qual for, mas uma corrente. O que faria todo o sentido, senão colocassem automaticamente tudo o que não se encaixa nessa corrente como errado ou menos importante.
Percebemos, se já há pacotes para tudo, porque não pegar num "pacote de parentalidade"? Escolho uma filosofia, ou um guru, ou as escolas que se classificam melhor nos rankings, ou as escolhas da maioria que me rodeia ou me identifico, e está definida a minha filosofia parental, é só seguir a receita!
Como sabem , os que nos seguem já há um bocadinho, esta é a razão deste espaço. Este espaço surgiu pela nossa percepção de que, grande parte de nós pais, está preso a esta adolescência interminável, e precisamos urgentemente de dar o salto. Nós também estivemos aí, e por vezes, ainda hoje caímos nalgumas armadilhas, como seria de esperar, mas percebemos que é juntos que conseguimos manter as nossas mentes despertas e os nossos corações abertos, e voltarmos ao nosso caminho, ou encontrar outros, dependendo da situação que nos surja no momento. E o nosso maior desejo é ajudar quem podermos a fazer o mesmo. Percebemos que aprendemos tanto ou mais com as diferenças do que com as semelhanças, e que não há receitas para a parentalidade, e que todos aprendemos com todos.
Precisamos todos como pais, de descobrir o nosso âmago, de soltar o que não nos serve e abraçar o que ressoa em nós. Não importa o que diz, o pedagogo, o médico, os avós ou a vizinha, importa o que nos diz a nossa criança!
Encontramos uma grande maioria de nós com medo, dúvidas e ansiedades criados por, nada mais que esta cultura dos Media, esta cultura das Redes Sociais, que nos quiz fazer acreditar que somos a geração mais cool de sempre, com as vidas mais fantásticas ( pelo menos segundo o Instagram) de sempre, e que se queremos que a nossa vida ( e a dos nossos filhos) seja de determinada forma teremos de seguir a receita daqueles que nos apresentam a versão dourada daquilo que aspiramos.
Por falar na a expressão cool, o estrangeirismo que facilmente as gerações dos Media adoptou, esta deveria ter sido um sinal de alarme, fomos a primeiras gerações a querer ser cool ! O que é ser cool?
Não percebendo nós na época, que isso queria dizer que éramos frios não apenas simbólica mas literalmente. Isto é, termos a imagem de distantes, inatingíveis, nada nos consegue tocar ou afectar, em que a nossa vida é um caminho perfeito. Ou seja, que a nossa imagem exterior era mais importante que o interior, quando todos sabemos que a perfeição não existe, deixamos nos convencer a perder, aos bocadinhos, parte da nossa humanidade- a fragilidade. Não fomos tão atrás, como regressar aos "rapazes não choram", mas pouco, a pouco, aprendemos que mascarar a nossa identidade com símbolos de pertença, perfeição, e consumismo. Tenham estes o formato externo que tiverem, apresentam-se como a solução para sermos aceites e validados. Voltámos a um tribalismo mas este agora moderno e virtual, no entanto este parece criar mais insegurança e isolamento que ajuda e partilha.
Ao arrastarmos progressivamente este forma de estar para a idade adulta, foi que em vez de a abandonarmos o que não nos pertencia e, finalmente percebermos quem éramos e o que queríamos, continuamos a encontrar caixas para nos arrumar ao longo da vida. O mundo foi-nos sempre dizendo que precisamos de mais e mais, e o que é aceite ou não por aqueles cujos vidas queremos alcançar, e que ele sabe melhor do que nós próprios do que precisamos e devemos ansiar. E nós acreditámos! Mas levamos os nossos filhos de arrasto, não nos podemos esquecer!
Ser mãe ou pai, é o previlégio máximo do ser humano ( para aqueles que tomam esta decisão). É o termos à nossa responsabilidade a sobrevivência de outro ser humano, o caber-nos a nós, como tal, ser o guia pela vida desse pequeno ser. E, como tal, cometeremos erros, teremos dúvidas, pois só com os nossos erros podemos aprender, se a vida não nos proporcionar desafios e obstáculos, nunca teremos a oportunidade de nos questionar e progredir ou voltar a atrás, se percebermos que o caminho não é por aí. E não há caminho com mais desafios do que o da parentalidade.
Ou seja nós temos aos sermos pais, a segunda oportunidade de ultrapassar a nossa adolescência, inclusivamente a nossa biologia prepara-nos para isso ( aquelas que tiveram no nosso workshop do sono, sabem do que falamos, os restantes se tiverem curiosidade peçam-nos nos comentários ou por email ).
Agora são os nossos filhos que ao pedir que os guiemos, tornam-se eles mesmos os nossos guias, ao fazer-nos duvidar de nós próprios, das nossas convicções e certezas, que muitas vezes caem por terra ao sermos confrontados com uma nova realidade, a realidade do outro. Mas mesmo aí, muitos de nós prefere ignorar ou atribuir mais um rótulo, preferimos seguir a receita do que olhar para o ser na nossa frente. Pois temos medo, pois deixámos de acreditar em nós. Porque isto não vai ao encontro do que os guias diziam que deveria acontecer se nós fossemos verdadeiramente um pai ou mãe tal!
A verdade é que os únicos que podem ser verdadeiros peritos sobre os nossos filhos somos nós!
E como tal, temos acima de tudo de saber quem somos, para além dos rótulos e dos títulos. Não há uma receita para sermos os pais que queremos e termos os filhos com que sonhamos, ou pensamos sonhar! Há ideias com que nos identificamos, ciência que respeitamos, biologia que honramos, mas dificilmente, alguém terá encontrado a formula mágica de criar pequenos humanos seguindo ipsis verbis a bula de alguém.
Porque os nossos filhos não querem saber se seguimos a pedagogia "a" ou a abordagem "b"; se estão numa escola "x ou y", se esta é publica ou privada, porque brincam com determinados brinquedos e outros não, e de tantas outras coisas mais.
Os nossos filhos querem saber é que temos o bem-estar deles acima de tudo e que toda e qualquer decisão que tomamos é por os escutarmos e vermos e estarmos a respeitar quem eles verdadeiramente são.
Eles querem saber que vamos construindo, ao longo do caminho, em conjunto com eles, a nossa identidade como pais. E, como tal, ninguém é o resultado de um inquérito ou de uma lista de requisitos, e não existem receitas para termos uma criança ou familia "X", todos nós somos e nos construímos, no dia a dia, ao viver.
E acima de tudo, importa saber que toda e qualquer decisão na nossa vida veio de nós, de nos questionarmos, e não de um guião pre-escrito por alguém do quem deveremos ser! Pois cada um de nós é único, e como tal, cada filho é único, e é isso que torna este mundo tão especial.
E como tal , voltamos ao início deste post, não, nãos somos mães waldorf, somos nós mesmas e construímo-nos todos os dias em conjunto com os nossos! E TU?
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