Recorda-se dos seus dias de infância? Daquelas brincadeiras desenfreadas na rua, com joelhos esfolados e um rosto radiante de vitória? Ou das conversas sentado nos degraus da entrada, rindo e construindo histórias, com ou sem adereços, inventando jogos? Das horas a jogar cinco pedrinhas, almofadinhas ou berlindes, ou a desenhar jogos de "macaca" e "polícias e ladrões" no chão com giz. E das caminhadas em grupo, a pé ou de bicicleta, em aventuras por amoras silvestres ou frutas nas árvores.
Aqueles tempos em que, ao chamado dos pais, regressávamos a casa para as tarefas diárias, partilhando refeições em família. Essas memórias são valiosas, mas hoje, onde vemos esse tipo de brincadeira?
Sabemos que a vida mudou: o aumento dos carros, as famílias nucleares que limitam o cuidado dos irmãos mais velhos pelos mais novos, substituídos por ajudantes domésticas, atividades extracurriculares, ou escolas em tempo integral. Os adultos, ocupados a trabalhar fora, procuram dar o melhor aos filhos, muitas vezes materialmente, mas as crianças perderam a liberdade de brincar nos bairros.
Há uma pressa em acelerar a infância, colocando crianças de cinco anos ou menos na escola primária numa corrida pela inteligência. Pesquisas indicam que a escolarização precoce pode mostrar avanços nos primeiros anos, mas muitas dessas crianças, sobrecarregadas de informação e pressão, acabam por não desenvolver habilidades essenciais para lidar com crises e desafios futuros.
Esquecemo-nos de que a infância é um estado de graça, um tempo para armazenar sabedoria para o futuro. Perdemos a capacidade de empatizar com as crianças, de ouvir as suas vozes e entrar no seu mundo. Esquecemo-nos que podemos protegê-las e, ao mesmo tempo, deixá-las livres para descobrirem quem são.
"Brincar na Infância, em vez de ser opcional ou extracurricular, é fundamental para a saúde de um Indivíduo em desenvolvimento." - Stuart Brown
A criança que brincou livremente nos primeiros anos de vida é mais resiliente ao stress na idade adulta, melhor ajustada em casa, no trabalho e nos relacionamentos. Hoje, a brincadeira livre, que outrora preenchia a vida das crianças, é cada vez mais rara.
Esquecemo-nos de que o brincar livre deve ser o centro da infância, não relegado a um tempo livre ocasional. É necessário garantir que as crianças tenham liberdade para brincar sem a pressão dos resultados, permitindo-lhes expressar-se e explorar o mundo à sua volta.
Como adultos, assumimos o controle do brincar, gerindo e direcionando as atividades das crianças, muitas vezes sem perceber que isso transforma o brincar em trabalho. O verdadeiro brincar surge espontaneamente, impulsionado pela imaginação e descoberta.
Para um brincar genuíno e livre, é necessário um ambiente sem excesso de estímulos e com materiais simples. Ao proporcionarmos estas condições, podemos observar a magia da imaginação infantil em ação.
"Não é apenas uma criança a brincar; mas sim os cérebros que resolverão os problemas de amanhã em desenvolvimento!" - Deborah Macnamara
Para brincar verdadeiramente livre, segundo Neufeld, as crianças precisam de liberdade de dor, fome, cansaço, instrução, escola, atividades programadas, ecrãs, e entretenimento. Brincar deve ser uma atividade expressiva, exploratória e, acima de tudo, não deve ser trabalho ou real.
Vamos criar oportunidades reais para as crianças brincarem, assegurando que o seu envolvimento numa atividade seja livre de expectativas de resultados e que não sejam limitadas pelo medo das consequências na vida real. Permitamos que as crianças sejam os verdadeiros agentes do seu brincar.
BIBLIOGRAFIA:
"Worlds of Fun: Playfulness and Child Development" na revista EcoParent escrito por Dr. Deborah MacNamara.
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